Estagiários
no MPPA: a terceirização disfarçada do cargo de auxiliar de administração
Por Mauricio Matos*
No início do ano, em carta publicada no sítio eletrônico do Ministério
Público do Estado do Pará – MPPA, o atual gestor, Procurador-Geral de Justiça
Marcos Antônio Ferreira das Neves, enumera algumas ações de sua gestão que supostamente
comprovariam seu discurso de que houve avanços na relação com os servidores.
Para quem trabalha no MPPA e vivencia os problemas do cotidiano, ficou
claro se tratar de mais um conto da carochinha. A realidade dos servidores do
MPPA é bem distinta do mundo do faz de conta que se tenta vender para a
sociedade paraense.
A cada dia o meio ambiente de trabalho se deteriora ainda mais. É
visível a insatisfação dos servidores com o atual modelo de gestão, salvo, é
obvio, aqueles poucos agraciados com privilégios financeiros que elevam seus
salários a valores similares ou superiores aos subsídios de promotores e
procuradores de justiça. E mesmo dentre esses servidores com alto padrão
salarial, a satisfação não é unânime.
A precarização do trabalho, o assédio moral, a negação de direitos, a
perseguição política e o achatamento salarial, são alguns dos elementos presentes
na atual gestão do MPPA. Têm sido privilegiadas as ações que contribuem para o
sucateamento do serviço público, como as terceirizações (abertas ou
disfarçadas) levadas a cabo nos últimos anos, bem como a desvalorização dos
servidores públicos efetivos, fato que tem causado desânimo, problemas de saúde
e pedidos de exoneração.
E esse caos no meio ambiente de trabalho é indiretamente sentido pela
população, que percebe a queda da qualidade no atendimento ao cidadão. Isso,
quando esse atendimento ocorre.
As exigências para que os órgãos públicos se tornem mais transparentes
tem levado ao desenvolvimento de ações importantes. A existência dos “portais
da transparência” é um exemplo. Por esse mecanismo de divulgação de informações
– por mais frágil e incompleto que seja – o Sindicato dos Servidores do
Ministério Público do Estado do Pará – SISEMPPA tem pesquisado e obtido muitos
dados que servem para traçar o perfil da administração pública.
O modelo de gestão empresarial e privatista de Marcos Neves, e toda a
consequência negativa para os trabalhadores, decorrente desse modelo, pode ser
observado (parcialmente) nas informações do portal da transparência do MPPA.
Durante sua gestão foi intensificado o processo de privatização do MPPA,
com as terceirizações dos serviços de limpeza e de condução de veículos. Mas,
paralelo a essas, outra “terceirização”, disfarçada, está ocorrendo. O quadro
abaixo mostra a quantidade de estagiários “empregados” no MPPA no período de
agosto/2013 a dezembro/2015, uma vez que não há informações disponíveis no
portal da transparência dos meses anteriores.
No gráfico há uma interrupção no mês de janeiro/2015 em razão de não
haver dados oficiais disponibilizados sobre esse mês.
De resto, observa-se uma curva ascendente e praticamente constante, cuja
trajetória é alterada somente no final dos anos de 2013 e 2014, quando ocorre
ligeira queda na quantidade de estagiários. Entretanto, essa dinâmica se
modifica e volta a crescer nos meses seguintes. Nesse período, o aumento da
quantidade de estagiários cursando o ensino médio e superior foi na ordem de
41,3%. Esse percentual é muito além daqueles observados nas demais categorias
funcionais que compõem o MPPA.
Nos Demonstrativos de Remuneração de Pessoal publicados no Diário
Oficial do Estado o MPPA divide o corpo funcional em 3 categorias: Membros (que
inclui os promotores e procuradores de justiça); Militares (que inclui os
policiais e bombeiros militares cedidos para o MPPA) e Servidores (que inclui
os efetivos, os cedidos e os não efetivos/assessores). Dentre os Membros,
observamos um crescimento quantitativo de 9,25%; entre os Militares, o aumento
foi de 24,16%; e entre os Servidores, tal marca atingiu 24,92% a mais (sempre
se considerando o período de agosto/2013 a dezembro/2015).
Verifica-se que a quantidade de estagiários teve um aumento percentual
bem superior à quantidade de membros, militares cedidos e servidores. Tal
elemento é uma característica marcante da política de “contratação” de mão de
obra barata que proporciona a “terceirização disfarçada”, aliada à precarização
do trabalho.
Importante registrar que em agosto/2013 não existiam estagiários
cursando o ensino médio. Dos 469 estudantes que estagiavam no MPPA naquele ano,
75% cursavam Direito; 15% Administração e os demais 10% estavam matriculados em
12 diferentes cursos, como Serviço Social, Odontologia, Ciências Contábeis,
etc.
Esse quadro sofre uma grande mudança nos meses seguintes. Em
dezembro/2015 os estudantes cursando o ensino médio passam a responder por 25%
das vagas de estágio. E embora as vagas para estágio de nível superior tenham
aumentado em número, proporcionalmente foram reduzidas. Naquele mês, do total
de 799 estagiários (médio + superior) do MPPA, 55% eram alunos do curso de
Direito; 13% de Administração e 7% estavam matriculados em outros 12 cursos.
Essa mudança, que não teve nenhum objetivo pedagógico, busca
intensificar a redução no gasto com pessoal, desviando atribuições dos
servidores públicos para a responsabilidade de jovens trabalhadores, que
necessitam ajudar financeiramente suas famílias e buscam abrir espaços no
mercado de trabalho. Sistematicamente a demanda por mais servidores, oriunda
das chefias das unidades administrativas do MPPA, seja na capital ou no
interior do estado, quando é atendida, se faz com a oferta de mais estagiários.
Tal política tem gerado a desvalorização dos servidores, a precarização
da mão de obra “contratada” e o desperdício de dinheiro público, se considerarmos
que a grande rotatividade dos estagiários implica em uma constante política de
capacitação, não progressiva, mas repetitiva e com baixo retorno, uma vez que a
cada novo estagiário que assume a vaga se faz necessária sua ambientação e
treinamento para o exercício de suas atribuições. E ao se desligar do estágio
leva consigo todo o conhecimento adquirido, trazendo enorme prejuízo ao Serviço
Público, que na maioria das vezes não poderá usufruí-lo, diante a
impossibilidade de renovação do estágio após dois anos.
Algumas categorias profissionais já foram privatizadas no MPPA. Os
serviços de limpeza e condução de veículos foram terceirizados e os cargos de
auxiliar de serviços gerais e motorista foram colocados em extinção. E já se
planeja a terceirização da recepção e da telefonia. Para o cargo de auxiliar de
administração o que se observa é uma “terceirização disfarçada” pois a cada dia
boa parte de suas atribuições são desviadas para os estagiários, em especial
para aqueles ocupantes de vagas de nível médio e para os estudantes do curso de
Administração que ocupam vagas de estágio de nível superior.
Essa substituição dos servidores ocupantes do cargo de auxiliar de
administração por estagiários pode ser identificada ao se comparar a variação no
quadro de pessoal. Entre agosto/2013 e dezembro/2015 houve um acréscimo de
31,5% na quantidade desses servidores (auxiliar de administração), passando de
371 para 488. No mesmo período a quantidade de estagiários (somados apenas: nível
médio + nível superior/Administração) saltou de 68 para 308, com uma variação
de 352,9%.
Se adicionarmos ao gráfico anterior as informações sobre o cargo de
auxiliar de administração poderá ser observado com tranquilidade a diferença na
política de contratação de pessoal. Enquanto a quantidade de estagiários cresceu,
mês após mês, o número de auxiliares de administração permaneceu praticamente
inalterado após novembro/2013, quando houve nomeação dos candidatos aprovados
no concurso público de 2012.
Enquanto a política de “contratação” de estagiários obedece um aumento
constante, a nomeação de novos servidores para o cargo de auxiliar de
administração fica estagnada, alterando-se apenas quando há substituição de
servidor que requereu exoneração ou aposentadoria.
É importante atentar para o fenômeno ocorrido no final de 2013 e início
de 2014, quando a relação se inverte. Em janeiro/2014 é registrado o menor
número de estagiários do período (413). Nesse mesmo mês observa-se o maior
número de auxiliar de administração do período (507). Seria mais uma
constatação de que tem ocorrido a substituição de servidores por estagiários?
Aparentemente, sim.
Por estágios remunerados com objetivos pedagógicos.
Basta de precarização do trabalho no MPPA.
Não à terceirização/privatização do Serviço Público.
Nomeação dos aprovados em concurso público.
Em defesa do Serviço Público de qualidade.
*Mauricio Matos é
Diretor-Presidente do
Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Estado
do Pará – SISEMPPA